Tuesday, November 20, 2012

NÃO ERA A PRIMEIRA VEZ QUE O RAPAZ FOTOGRAFAVA O MOTORISTA!



Crónica de um passeio em Aveiro


Ontem decidi dar um passeio de autocarro. Ainda que pareça caricato eu não sabia onde devia exatamente descer, sabia que no fim de tudo devia estar na Zona Industrial. O impasse sobre a paragem prolongou-se no meu diálogo com o motorista, não só pelo interesse de não perder-me, como para poupar no custo do bilhete. O motorista por seu turno respondeu sobre os dois locais que associei com o meu destino provável o seguinte:

- Não sei amigo, eu também não sou de cá. A zona industrial não vamos a nenhuma, mas passamos sim por...

Cá comigo, devolvi aquela sensação amargurada do motorista com um pouco de humor…”Vamos jogar a lotaria…talvez desta nos saia todos o prémio” Na verdade sou muito compassivo para com os mais velhos, sobretudo nestas profissões que a história associa com o sacrifício e maus salários. Entretanto eu sou quem tem precisado de muito cuidado. Após duas paragens, lá vinha outra passageira aflita.

- O autocarro passa por….

O motorista retorquiu a senhora com falta de piedade nunca imaginada, diante da confusão que existe aqui na cidade pela mudança das rotas, linhas, horários dos transportes públicos e semi-publicos e notei parte do discurso

- Isso é no escritório! Vem aqui abusar…..

Naquela minha forma pedagógica de abordar as coisas, senti-me obrigado a intervir. Esclarecendo-o que para nós, passageiros, os motoristas são os representantes da empresa, e que o diálogo com eles era mais confortável que o escritório. Confessei ainda que não sabia onde era o escritório daquela companhia e sempre me socorri nos motoristas…e depois continuamos calmamente a viajar até que entrou o melhor passageiro da viagem.

Tratava-se de um menino com cerca de 8 anos. Já põe óculos para compensar/corrigir algum problema de vista. Ele como muitos, exprime as tendências do tempo, é “geração tecla e click”. Enquanto ele mostrava seu livre- passe, tirou um foto ao motorista com o seu telemóvel, mas a face dele deixou-me perceber que não tinha sido bem-sucedido. Pensei muitas outras coisas, incluindo uma espécie de admiração do petiz pelos motoristas. Depois parei de pensar, porque o rapaz passou la para os bancos traseiros.

Passados alguns, minutos.

Eis que o rapaz reaparece, senta-se nos bancos de frente e posiciona-se para o que se pensou ser o desembarque e o motorista perguntou-o sobre onde ele pretendia descer? Enquanto respondia, tirava o que me pareceu ser a sua melhor foto da viagem…precisavam ver como eu vi. Voltei a pensar e a questionar-me. Será neto dele? Familiar? O rapaz fotografava com uma segurança fenomenal. Não tardou a reação do motorista.

- Vamos combinar uma coisa. Da próxima vez que me quiseres tirar umas fotos terás que me pedir autorização. Pois que é a segunda vez que fazes isso.

O rapaz retorquiu afirmativamente com a cabeça…e passava mais uma paragem eu e ele descemos.  Interessou-me questiona-lo, porque é que ele sacou as fotos. Eu sou mais tímido que ele, não o fiz. Por outro lado, pensei que a minha atitude, o questionamento da razão, levaria à inibição de uma forma de ser que até admirei. Fiquei por tirar muitas conclusões, afinal era a segunda vez que o rapaz lançava um click sobre o motorista.

Aveiro, 20/11/12